Eu empurrava a minha vida com a barriga. Era um coma consciente e adrede sem poesia, uma queda. Deixava uma foto dele no altar das lembranças mais bonitas. Mas eu evitava olhar para seus olhos ou mesmo encarar o seu riso sincero e fácil. Era uma alegria lancinante, ingênua. Era como um prêmio recebido que, sem alternativas, era cultuado platonicamente por mim.
A água ficou turva de novo quando, por descuido ou instinto mal controlado, abri o baú no qual eu escondia alguns sentimentos, algumas palavras não ditas e dous ou três amplexos não sufocados. Suspirei, prendi a respiração o quanto pude para ver se o choro se engasgava, para ver se as lágrimas desaguavam numa outra represa. Meu istmo para com ele não mais estava submerso, e eu podia tão-simplesmente atravessá-lo – mesmo que sabendo das dores.
Meu filho. Agora a saudade emergia mais forte ainda. Cinco meses apenas sem ele. A água turva das minhas memórias era demasiado salgada para que eu simplesmente afundasse. Eu me afogo aos poucos, pois não há salva-vidas contra a maré da saudade.