segunda-feira, 21 de setembro de 2009

pajarillo

primeira vez que chegou, um amigo o trouxe. Depois ele aparecia vez ou outra. Lembro dele deitado na madeira do chão com os cotovelos apoiados no piso pra escutar o português bonito dos desenhos animados. Era esculpido em fumaça. A gente passava por ele, tropeçava nele, falava sobre ele e o brilho de seu menino-dos-olhos não se apagava nem se movia.

As vezes vestia uma blusa curta de paetês velhos e saía pra comprar a mistura do dia. Mal sabendo que era ele quem misturava os olhares, latejando o dia dos transeuntes no caminho da quitanda.

Chorava, mais chorava que ria. Até pelo irmão estúpido e pela mãe puta que deixara como visão afastada no tracejado entre sua casa, nos confins de Pasto, e a carretera que dava pra escola. Kilometricamente distante. Minuciosamente esquecida. Ela sempre o mandava pra rua como se o cuspisse pro mundo, mas ele voltava por detrás da poeira levantada depois que acabava a última aula. Diz que foi numa poeira dessa que um dia ele apareceu aqui no cerrado.

Chorava, mais chorava que ria. E me contava que jogou os pés no mundo, mas que sonhava em ser modelo. Contudo sabia, era da laia dos andejos que vão pra onde aponta o nariz quando acordam. Feito un pajarillo sensível, chorava os corpos que pelo dele passavam.

Um dia pintou os olhos com um cajal azul, mais forte que de costume. A linha nos olhos fechava seu corpo, feito patuá, pro mal que vinha de fora. Era uma fortaleza de ir à guerra que era sua rua de cada dia.

Nem esperou o cuzcuz pro desayuno. Olhou pra mim, bateu a porta e não disse palavra sobre o doce estampado na almofada da sala.

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