sexta-feira, 22 de outubro de 2010

manual de colonização rápida



- me coloniza, please.
- sem sangue, please.
- ainda doador universal?
- enquanto precisarem de tinta, sim. e os caçadores de aventura, sobrinhos do tio patinhas? têm visto essa galhera?
- soube que morreram todos atropelados. se não me engano.
- muito bom. vejo que alguém passou de fase com tantos pontos.
- mas a dircinha última vez que vi há muito tempo atras até pq nao sei se ela morreu atropelada- te mandou um ok.
- diga-lhe que eu cliquei no ok dela. daí teu tela vermelha. felizmente, você sabe...tivemos quorum das cores.
- tudo anexado conforme deliberado na velha assembleia .posso enviar sem compactar?
-pode. recebi. nossa, que eficiência, meo. vou te promover. será uma planta aérea a partir de agora.

(e aí, a tal torta de liquidificador rápida gostosa recheada de verde musgo entra na sala perguntando: se for de graça, ainda é consumo?)

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

...

um pequeno momento,
agonizando na crença d'um amor sem raizes


[porque mistério sempre há de pintar por aí]

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Cânticos Corsários

Não cabe a mim culpar aqueles que tinham boa vontade comigo, que tentaram me ajudar. Mas sentia, do fundo do meu universo, uma imensa vontade de cuspir na face dos que se atreveram a me desejar o bem.

Não posso me culpar por ser de trato tão difícil. Em conversas que mantive comigo, reconheci que sou áspero, sem travas na língua e que me indispunha facilmente com as pessoas. Pediam-me bom senso, bons modos, contenção. Respondia com desdém, irreverência e excesso aos apelos da gente de classe média bem comportada, branca e heterossexual, que se orgulha de suas esquizofrenias sociais.



Mas a minha maneira era um aristocrata, mesmo sendo complexo e difícil como a sífilis.

(Atchim memories)

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Aquele cheiro passou a ser meu. Eu nem gostava dele, assim como eu não estava gostando de ficar careca. O cabelo caía como se fosse a cabeça alheia e o cheiro forte e azedo de boca de boemia no travesseiro estava agora em mim, me perseguindo nos momentos de mais abundante pureza. Ele havia mijado em mim, esfregamo-nos tanto que eu virei a sua fêmea, para mim mesma. Sua fêmea por radioatividade. Como um acidente nuclear. Que fez com que meus pés crescessem e ficassem maiores que as minhas costas. Eles ocupavam uma área descabida, principalmente para subir degraus e calçar sapatos.

Os joelhos começaram a emitir um forte brilho dourado e um som de engrenagem descansada.

O mato impenetrável era uma floresta negra escondida no meio das duas pernas, e era iluminada somente sob certo ângulo de reflexo dos joelhos.

A percepção aguçava-se e as minúcias se tornavam evidentes texturas indomáveis trocando de lugar. Nesse momento o sangue fervia e o tempo simplesmente me chupou para a rua.

Caí no asfalto, na dureza fria do cordão da calçada. A cabeça tonta foi buscando o foco até recobrar a precisão. Comecei a andar, com as mãos no bolso, ouvindo as vozes dos mendigos. O medo era suave e a madrugada fria, como todo urbanóide só que caminha no meu imaginário.

Gate-se, engate-se e agarre forte na bicicleta.

Esgote-se e agonie

Seria gasto, inválido e passado todo o tempo que gozaste comigo

Se não fosse próspero mesmo que instantâneo.

Das calçadas frias, planas e paralelas fui parar embaixo de uma queda d’água, como uma Alice.

O sono veio chegando. O corpo pedia descanso e comida, optei pela primeira opção.

O cheiro agora não me persegue mais, oportunista ele se mistura com outro cheiro meu para me lembrar que ainda está aqui.

As estrelas caíam devagar. A lentidão do escuro mostrou o tempo passando de verdade, alheio a cronometragem dos relógios. Me encontrei com o tempo, não estava nem esperando que ele chegasse, nem correndo atrás dele. Estávamos sentados um em frente ao outro dividindo uma garrafa de vinho. O tempo é um camarada!

Nisso a casa começou a ruir e desmoronar aos poucos. Recolhi o que pude e saí correndo pela janela. O tsunami batia na porta e o piado interrompido dos frangos morrendo afogados davam a trilha para a minha agonia.

Não sabia como fugir. A casa prestes a desmoronar e eu estava sentada na janela do banheiro.

O refinamento da inspiração tinha simplesmente me abandonado. Estava sob a catarse cega e anestesiada dos sentimentos represados.

Abriria as comportas é verdade, mas não seria agora. Quando o enforcamento estivesse prestes a acontecer, faria inundar toda a praça pública, livrando carrascos e enforcados do desespero de matar e morrer. E o público teria sua morbidez curiosa lavada para sempre.

O cheiro desapareceu. Faz dois dias que ele não se manifesta.

Juntei as espadas e resolvi ajudar o acaso. Hoje é Dia de São Jorge e o vento anuncia guerra. A chuva passa ilesa sob a minha cabeça, apenas alguns respingos resfriam meu corpo incandescente. Poderia furar a terra, derretendo todo o caminho até o inferno, onde o diabo vermelho me colocaria em sua cama, presa, com outros diabos e diabas, assando até estralar a pele. O diabo de olhar agaviado, com os cachos pendendo na testa, não teria a menor piedade e colocaria no espeto o meu talento para boa moça, fazendo-me suplicar por minha malícia, me tornando uma aliada da carne e dos prazeres infernais.

Tenho que ir, chove, chove intensamente. O cheiro de terra molhada já invade as folhas. É hora! É hora de seguir o caminho.

Inaugurado o momento do charuto: de agora em diante é só prazer! Não importa que toque Sandra de Sá no bar ou que chova de inundar o meu quarto. Está decidido, o prazer acima de tudo. Para começar, uma cachaça! A cachaça anestesiava a boca. Os lábios absorviam o álcool e acreditavam que não existiam, que estavam independentes desse corpo, com vida própria, livres, sem nome, sem dono, adquiriram seu próprio coração, um lábio que sente por si só, e decide o seu caminho.

O princípio do prazer tormentou minha alma e os meus órgãos despertaram como uma cidade varrida pela catástrofe. A tristeza e o prenuncio da saudade faziam salivar a boca. O fim fez com que eu vomitasse aos soluços.