O dia amanheceu saudoso. Não podíamos mais ser. Acordávamos para a produção em série que é uma segunda-feira de manhã. Eu estava mais para o Chaplin do que para os Tempos Modernos, e o olhar buliçoso dele ao nos reencontrarmos na mesa do café indicava o mesmo.
Ninguém ali queria esquecer o que havia acontecido, mas a carga de memória que abandonamos para sermos, agora estava depositada em cima da mesa, ao lado dos pãezinhos d’água, entre o café e a manteiga, como um monte de correspondência a ler. Ignorada, entre o medo de encarar as coisas, e a dor de modificá-las.
-É possível nos vermos de novo.
- É possível sim.
- Mas não podemos nos tornar amantes. O açúcar, por favor.
- Amantes? Passa-me a faca.
- É uma idéia boba: uma boa idéia, porém, boba. O café ainda está amargo.
- A cuca está ótima. Melhora com manteiga.
- Às vezes eu tenho vontade de pegar o teu pescoço com as duas mãos e sacudi-lo assim, de levinho, repetidamente. Não gostei da cuca.
- Por quê?
- Não sei, porque eu tenho. Talvez seja a finura e a cor de seu pescoço.
- Por que não gostou da cuca?
- Porque eu não gosto de cuca.
2 comentários:
era waldick soriano, de terno louro e cabelo de linho dizendo que a gente acostuma a mentir pra gente mesmo.
dizem até que rodavam na cama feito ponteiro de relógio..
num desencontro marcado entre a finura do pescoço e a pele lambida de fome
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